03-05-2012 Joaquim Cunha Guimarães: o adeus de um trabalhador-sonhador
A má notícia era receada. Mas, como o Joaquim Cunha Guimarães era uma pessoa invulgar, subsistia um resto de esperança quanto a uma evolução invulgar da doença que o debilitava. Mas não foi assim. Na terça-feira, 1 de Maio, Dia do Trabalhador, deixou-nos contra a vontade dele e contra o desejo daqueles que tiveram a sorte de o conhecer.
Para trás ficam 53 anos de uma vida intensa que começou com poucos recursos. À custa do trabalho, do rigor, do talento aplicado, o Joaquim ascendeu por mérito próprio a uma posição de liderança intelectual e profissional unanimemente reconhecida nas suas áreas de atividade. Conforme referia com o sorriso sempre estampado no rosto, era TOC, ROC, e "DOC" a expressão por si criada para designar docente oficial de contabilidade. E era também um cientista, apaixonado pela investigação na contabilidade e auditoria e admirador do trabalho dos grandes mestres. Apesar de ter sido ele próprio um grande mestre, nunca assumiu essa condição e mantinha sempre a humildade. No seu caso, a humildade traduzia-se numa forma superior de grandeza. A sua última intervenção pública foi feita há alguns meses no Congresso Prolatino, no Porto. Apesar de debilitado pela doença, teve uma intervenção brilhante que justificou o comentário de Pinheiro Pinto: "Por aqui se vê a falta que a contabilidade faz ao Joaquim Guimarães e a falta que ele faz à contabilidade". A sua ação compreendia também a atividade associativa, como presidente do Conselho Fiscal da OTOC, projeto a que se dedicava de forma participada e empenhada. O trabalho era a forma de o Joaquim estar na vida. Os projetos que realizava eram o ponto de partida para os novos projetos que se seguiam de forma metódica, coerente e sistemática.
Há algum tempo, comentou: "Os médicos dizem que eu devia reduzir o ritmo de atividade. Mas o que é que uma pessoa pode fazer?". A dedicação total às causas onde se envolvia foi uma constante, mesmo na fase terminal da vida. Na passada sexta-feira esteve a finalizar os conteúdos da próxima edição da revista "Contabilidade & Empresas" e deixou-nos uma série de trabalhos ainda não publicados que continuou a fazer com a qualidade e originalidade que o distinguiam.
Para lá do profissional e intelectual que qualquer um gostaria de ser, o Joaquim era também uma pessoa com qualidades humanas fora do comum. O trato fácil e afável, a simplicidade na forma de ser e estar, a clareza de valores e princípios, a defesa intransigente da ética destacavam-no para qualquer um de nós, fosse qual fosse o termo de comparação.
O facto de pensarmos na pessoa e na obra realizada acentua a sensação de perda. Recordar o que disse ou ler o que escreveu é muito mas é ao mesmo tempo pouco, porque queríamos que continuasse entre nós e não conseguimos preencher o vazio que agora fica. Para todos aqueles que tiveram oportunidade de conhecer ou de trabalhar com o Joaquim, a sua partida antecipada gera um saldo valioso e raro na contabilidade da vida, sob a forma de um débito que nunca conseguiremos saldar.
Um exemplo de atitude positiva
Aqueles que conheceram Joaquim Guimarães não vão esquecer a sua forma positiva de pensar e a coragem com que enfrentava as adversidades.
Depois de ter sido operado, e quando pensava ter vencido a doença, foi confrontado em setembro passado com resultados de exames muito desfavoráveis que partilhou numa mensagem enviada a um conjunto de pessoas amigas que a seguir transcrevemos. Apesar da gravidade do quadro clínico, enfrentava a situação com enorme coragem e sem perder a boa disposição.
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Especialista em contabilidade e auditoria
Joaquim Cunha Guimarães era Mestre em Contabilidade e Auditoria pela Universidade do Minho e Licenciado em Gestão de Empresas. Era Revisor Oficial de Contas e Técnico Oficial de Contas, exercendo funções de Presidente do Conselho Fiscal e Vogal da Comissão de História da Contabilidade na Câmara dos TOC, diretor do portal de contabilidade Infocontab, e diretor da revista Contabilidade & Empresas.
Foi o autor de uma série de livros de fundo na área da contabilidade, vários deles publicados pela Vida Económica. As obras mais recentes foram Estudos sobre Normalização Contabilística em Portugal, A Profissão, as Associações e as Revistas de Contabilidade em Portugal, Os Mestres e Professores de Contabilidade em Portugal. |
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João Luis de Sousa |
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