02-11-2012 António Cunha, presidente da secção regional Norte da Ordem dos Economistas, alerta "Orçamento de Estado não é conforme ao que está escrito no memorando da troika"
Portugal apenas conseguirá captar uma vaga de investimento estrangeiro suscetível de criar riqueza e gerar emprego "quando forem cumpridas uma série de condições" e quando a "liberalização da contratação e dos despedimentos e a equalização das pessoas face ao posto de trabalho" for um facto, defende o presidente da secção regional do Norte da Ordem dos Economistas.
Em declarações à "Vida Económica" à margem de uma conferência, no Porto, sobre o Orçamento de Estado para 2013, promovida pela sociedade de advogados PLMJ, em que também foi orador, António Cunha não deixa dúvidas: para que tal suceda, diz, é precisa "a completa execução do programa de ajustamento da troika" e a "implementação das chamadas reformas estruturais a que o FMI nos obriga". Lamenta, contudo, que o que está no Orçamento não esteja "conforme ao que está escrito no memorando".
Questionado sobre o que falta para que Portugal atinja então esse objetivo, o economista não hesita: "falta a liberalização de contratação e de despedimentos e a equalização das pessoas face ao posto de trabalho", no que diz respeito, por exemplo, à " questão da antiguidade" no pagamento das indemnizações.
"O nosso desemprego jovem é o que é porque quem tem emprego, de acordo com a nossa legislação, tem mais direitos do que quem acaba de ser contratado ou do que quem está fora do mercado de trabalho", disse este especialista à "Vida Económica". Defende, pois, que "o mercado tem de ser liberalizado", pois, "na prática, as empresas não podem contratar, porque depois não podem despedir". E isso leva a que contratem "a prazo ou [com recurso a] temporários", levando a "uma segmentação do mercado de trabalho que é injusta para os mais novos porque estão sempre na precariedade absoluta".
Questionado sobre se acredita que ,com a revisão das indemnizações por despedimento, que deverá ocorrer agora em novembro, o país se tornará mais atrativo ao investimento estrangeiro, António Cunha clarifica. "Não é propriamente o preço [das indemnizações por despedimento] que está em causa", mas "a liberdade de o fazer [despedir]".
"O problema em Portugal é que nós somos baratos em tudo, até nos despedimentos", refere António Cunha, lamentado que não tenhamos "liberdade suficiente para empreender e falhar". "Se eu quiser empreender e falhar, tenho de poder fechar a empresa, tenho de poder despedir-me a mim próprio e despedir os meus colaboradores e poder recomeçar a seguir", observa o economista, resumindo tudo numa frase: em Portugal, "a mão-de-obra é barata, os despedimentos são baratos, é barato o licenciamento, temos é pouca liberdade individual, pouca liberdade de empreender e criar riqueza".
"Ninguém quer pôr dinheiro" nos fundos de revitalização
Em Portugal são milhares as empresas em situação difícil declaradas insolventes pelos vários tribunais, mas, para já, apenas pouco mais de 200 aderiram ao Programa Especial de Recuperação (PER) no âmbito do Programa Revitalizar lançado pelo Governo. Ao todo, está previsto que apenas cerca de 300 adiram a esse mecanismo.
Questionado sobre esse facto, António Cunha diz que se o número de empresas a recuperar fosse superior "era bom sinal", pois "quereria dizer que havia um número superior de empresas que conseguiriam revitalizar-se e não fechar". Receia, no entanto, que "apenas cerca de 300 consigam reestruturar-se e que as restantes sejam para liquidar", pois "quando um Governo constitui uma equipa para um programa específico como este e escolhe 300 empresas é porque alguém as escolheu para salvar". Todas as outras em situação de insolvência "vão morrer".
Já quanto aos atrasos na operacionalização dos fundos de revitalização, o economista receia o pior. "Os fundos já deveriam estar a funcionar desde 1 de setembro", constata, temendo que os mesmos "não sejam para apoiar, mas apenas para converter dívidas [das empresas] existentes à banca em capital".
"Duvido que se façam fundos que permitam às empresas irem captar mais dinheiro", disse António Cunha à "Vida Económica". "Não acredito que haja, no momento atual, quem queira investir num fundo destes, a não ser que injetem dinheiro na empresa", reforça o economista. Em sua opinião, os bancos deverão converter o malparado "em capital". "Não vejo outra solução".
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TERESA SILVEIRA-teresasilveira@vidaeconomica.pt |
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