08-06-2012 Bolsa em "saldos"
Os melhores títulos da bolsa portuguesa registam este ano uma forte quebra do valor, atingindo mínimos históricos. Os bancos cotados apresentam quedas entre 35% e 73% face à cotação que tinham há poucos meses atrás. O potencial de valorização nunca foi tão grande, desaconselhando a venda aos preços atuais, ou justificando a compra de ações, embora haja riscos a ter em conta, em particular no setor financeiro.
O valor atual das ações está muito abaixo do valor contabilístico, refletindo a incerteza que resulta da necessidade de recapitalização dos bancos e os efeitos que podem resultar para os acionistas. No BES, a cotação de J0,50 é menos de um quarto do valor contabilístico de J2,3. No BCP, a ação a J0,09 é seis vezes menos face ao valor contabilístico de J0,53.
De uma forma geral, os ativos em Portugal estão subavaliados. "A crise de dívida europeia, a necessidade do país de recorrer a ajuda externa e consequente imposição de redução do défice e desalavancagem da economia são as principais razões para que grande parte dos títulos transacionem tão a desconto do seu valor" - disse Emília Vieira, presidente da Casa de Investimentos, à "Vida Económica".
Os bancos são os mais penalizados, como aliás acontece noutros países. O aumento do crédito malparado, a redução da atividade económica e perdas nos mercados financeiros motivam sempre um receio acrescido por parte dos investidores. "Infelizmente, grande parte dos investidores não tem capacidade técnica para aferir o valor das empresas ou deixaram de confiar" - refere Emília Vieira.
BCP desce com aumento de capital
No caso do BCP, a cotação rompeu o ponto de equilíbrio próximo dos J0,10, caindo esta semana abaixo de J0,09, havendo uma quebra de mais de 50% em comparação com o valor de J0,185 que a ação tinha no início de Fevereiro. No ano passado, o BCP teve prejuízos de 790 milhões de euros. Os resultados por ação foram de J0,12 negativos. Ou seja, as perdas foram consideravelmente superiores ao valor total do banco em Bolsa.
O banco que chegou a ser um modelo de gestão e de criação de valor revelou-se uma das piores aplicações para os acionistas que nos últimos anos perderam 97% do valor dos títulos. Em Junho de 2007 o BCP valia em bolsa 14950 milhões de euros. Agora vale menos de 600 milhões de euros.
O valor atual das ações em torno dos J0,09 é atrativo, mas a recapitalização com apoio do Estado pode dar origem à diluição do capital com uma perda considerável para os atuais acionistas.
"O BCP anunciou agora o montante do aumento de capital e as necessidades que terá do fundo do Estado. Importa agora saber em que condições é feito esse aumento de capital e fazer contas à diluição que causará aos acionistas e qual será o novo valor contabilístico do banco. Um ativo não deve ser comprado por palpite ou porque gostamos muito dele. Deve ser feita uma análise profunda da capacidade que o ativo tem de criar valor para o futuro" - comenta Emília Vieira.
"O BCP é talvez dos títulos mais disseminados da bolsa portuguesa e esta desvalorização tão grande inibe hoje muitos investidores de investir. À medida que o título foi desvalorizando, muitos investidores foram reforçando. Estamos em muitos casos a falar de carteiras mono título ou com exposição apenas a 2 ou 3 títulos no mercado nacional. Desde 2009 que aconselhamos a investir grande parte dos valores fora de Portugal" - acrescenta.
Para Emília Vieira, é importante aguardar pela definição do aumento de capital e fazer as contas. Há duas alturas na vida em que não devemos especular, nem quando podemos, nem quando não temos "bolso" para isso. Portanto, devemos aguardar pela clarificação de todas estas questões.
BES a recuperar
O BES é o único banco que não irá recorrer à ajuda externa, com intervenção do Estado. Há dois meses atrás jogou na antecipação, anunciando um aumento de capital que o colocou entre os bancos mais capitalizados da Europa. A operação foi bem sucedida mas teve custos pesados para os acionistas - mesmo para aqueles que acompanharam o aumento de capital - com a queda imediata das cotações de Bolsa. Nos últimos três meses, o valor das ações do BES na bolsa baixou 65%, deixando os acionistas com um terço do valor que tinham em Fevereiro e "obrigando-os" a acompanhar o aumento de capital com mais investimento. Mais de metade desta perda seguiu-se ao anúncio do aumento de capital. "Fazer aumentos de capital nestas conjunturas é sempre mau. Primeiro, porque o medo inibe os investidores e, segundo, porque há menos dinheiro disponível" - salienta Emília Vieira.
Atualmente, o BES vale em bolsa 2000 milhões de euros, já com o recente aumento de capital de 1010 milhões de euros. Em Julho de 2007 valia 8605 milhões de euros, resultando uma perda considerável de valor para os acionistas.
À cotação atual próxima de J0,50 o BES é um dos bancos mais baratos em Bolsa, mas a volatilidade é elevada. Só na quarta-feira passada a cotação do BES subiu 12%, passando de J0,47 para J0,52. Como fatores favoráveis destacam-se a qualidade da gestão, a estrutura acionista estável e a quota de mercado. Mas o banco tem uma exposição elevada ao mercado português, uma grande parte da carteira de crédito está nas empresas, o que pode ser uma fragilidade na atual conjuntura caracterizada por um elevado número de insolvências e aumento do crédito malparado. Se houver uma reestruturação da dívida do Estado português - cenário que não pode ser afastado - o BES, àsemelhança dos outros bancos, será confrontado com perdas elevadas.
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VIRGÍLIO FERREIRA virgílio@vidaseconomica.pt |
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