18-06-2012 João Silva Ferreira, presidente da APCOR, afirma A indústria da cortiça está num novo ponto de viragem
Exportando 90% da sua produção, apresentando uma balança comercial fortemente positiva, representando 2% das exportações nacionais distribuídas por mais de 130 mercados onde em alguns dos quais são das exportações nacionais mais relevantes, a industria da cortiça não terá sentido um impacto negativo proporcional à política de austeridade adotada no país.
Ao longo da conversa tida com a "Vida Económica " o empresário João Rui Silva Ferreira , presidente da Associação Portuguesa da Cortiça( APCOR), faz questão de salientar os grandes saltos a nível da inovação tecnológica e dos processos que a industria - largamente dominada pela produção da rolha- conheceu nos últimos anos, mas simultaneamente lança um alerta para os desafios que as cada vez maiores exigências do mercado vão impor à organização do tecido empresarial do setor.
Foi decisivo em termos de modernização do setor o combate ao TCA -"Gosto da rolha"-
Nos últimos dez anos a industria da cortiça conheceu significativas mudanças, ainda que de forma não radical. Há, no entanto, um momento que, para o presidente da APCOR, João Rui Silva Ferreira, marca a viragem no inicio do século. O qual tem a ver com o reconhecimento do problema sério que é o TCA - popularmente divulgado como o "gosto da rolha" - reconhecimento este que tornou urgente a superação deste problema, já que através de metodologias usadas nos Estados Unidos começava ser efetivamente quantificado com rigor.
João Rui Silva Ferreira insiste que foi este facto que ditou uma alteração do paradigma na industria da cortiça, pois levou a indústria a incorporar adequado know how técnico operacionalizado em laboratórios dotados da colaboração de engenheiros químicos, enólogos e outros técnicos e a implementar uma adequada certificação quanto a boas práticas. Designadamente para combater a introdução dos chamados vedantes - em alumínio e em plástico - destinados aos consumos de massas cuja linha estratégica de comunicação assentava precisamente na debilidade associada ao TCA nas rolhas naturais de cortiça. Uma vez que o mercado estava em crescimento, o impacto dos vedantes na rolha natural não foi assim tão abrupto mas cedo foi-se constatando a perda de quotas de mercado, o que levou a indústria de cortiça a desencadear com todas as suas forças acções reativas adequadas.
E é por este facto que o Presidente da APCOR não considera ter sido a década passada uma década perdida, não obstante o valor das exportações estar abaixo dos 100 milhões de euros face aos valores do inicio da década (atualmente o valor atual é de 800 milhões de euros), para o que contribuiu o problema do TCA, a valorização do euro e naturalmente a crise global focada em 2009 mas que já foi contornada.
Inovação e internacionalização serão sempre desafios
Em suma, esta década mudou muito a nossa visão e forma de actuar, conclui o presidente da APCOR. Basta referir, afirma, que em termos de ensaios do TCA se verificou uma baixa notável de 83% da respectiva taxa média de incidência, mas o mercado só irá descansar quando o nível de incidência for de 0%, pelo que considera João Rui Silva Ferreira que " não nos podemos acomodar no muito que foi de facto feito neste domínio".
"Enfrentamos pois novos desafios e encontramo-nos num novo ponto de viragem", acrescenta João Rui Silva Ferreira. Nesse sentido, assume que a APCOR deve aproximar-se mais do meio universitário onde existe poderoso know how científico e técnico nestes domínios.
O presidente da APCOR aposta ainda no reforço sustentado da dinâmica das exportações , salientando a importância relevante dos apoios públicos concedidos através dos programas de apoio à internacionalização que já se traduziram desde 2000 em quatro campanhas de comunicação, tendo a última sido a conhecida Intercork, comunicação esta que tem que estar prioritariamente orientada para o consumidor e simultaneamente enquadrando algumas mensagens correspondentes às dimensões do produto cortiça, as quais têm a ver com o vetor cultural/emocional, com a natureza e sustentabilidade do produto (v.g. nas ópticas social, económica, valia alimentar) e com uma lógica de produto de futuro, onde relevam novas aplicações em múltiplos domínios(v.g. engenharia civil, aeroespacial,)
Pulverização e subdimensionamento condicionam o setor
Em termos da estrutura empresarial da industria da rolha de cortiça, o presidente da APCOR afirma que se trata dum setor ainda muito pulverizado (cerca de 600 empresas industriais) e com um peso muito relevante de empresas com menos de 10 trabalhadores, pelo que se verificam perdas de valor ao longo do processo produtivo. E considera que tem ser levada a estas empresas, muito realisticamente, a mensagem de que o mercado vai ser cada vez mais exigente e que lamentavelmente nem todas o poderão acompanhar.
A nível de redimensionamento empresarial, João Rui Silva Ferreira considera que houve sérias tentativas de reorganização, mas a maioria delas deparou com obstáculos a movimentos no arreigado cariz familiar das empresas, como por exemplo fusões. Segundo o presidente da APCOR, a reorganização ir-se-áfazendo através de processos de verticalização ( abrangendo as diversas fases da cadeia de valor) bem como através da "especialização" de empresas em determinadores patamares de tal cadeia. E salienta que é bom não esquecer que o sector das rolhas naturais - ao adquirir grandes quantidades de matéria-prima que só utiliza em 15% - assegura não só o equilíbrio florestal a montante como também uma boa parte da competitividade dos produtos ligados a outras aplicações de cortiça.
|
Albano de Melo albanomelo@vidaeconomica.pt |
  |
|