22-06-2012 Carla Branco, especialista em Direito Comercial e Societário, Fusões e Aquisições, Energia e Imobiliário, explica Consumidores serão "incentivados a mudar para o mercado liberalizado" de energia
A liberalização dos mercados de eletricidade e gás natural em Portugal, um processo em curso desde 2000, vai entrar agora na sua fase final com a extinção gradual das tarifas reguladas para a generalidade dos consumidores.
Em entrevista à "Vida Económica", Carla Branco, especialista em Direito Comercial e Societário, Fusões e Aquisições, Energia e Imobiliário, explica como decorrerá a fase final do processo de liberalização do mercado energético nacional e quais as implicações para os consumidores decorrentes do período de transição.
Vida Económica - Antes de mais, quais as diferenças entre o mercado regulado de energia e o mercado livre?
Carla Branco - No mercado regulado os preços de fornecimento de energia são fixados anualmente pela Entidade Reguladora do Sector Energético (ERSE), existindo, assim, uma tarifa praticada pelo comercializador de último recurso (CUR), que é a entidade responsável por efetuar o fornecimento de energia elétrica aos consumidores que o pretendam, por contraposição ao mercado livre, em que os preços de fornecimento são estabelecidos por cada comercializador, que concorre livremente em preços e condições comerciais, observando as regras da concorrência, a legislação e os regulamentos aplicáveis.
Outras atividades, onde se incluem o transporte e a distribuição de eletricidade e gás natural continuam, ainda assim, a ser exercidas em regime de serviço público e em exclusivo, mas com acesso garantido por terceiros, em condições de transparência e não discriminação.
VE - Na prática, o que vai acontecer após a extinção das tarifas reguladas?
CB - Não obstante os consumidores disporem já da possibilidade de contratar um fornecedor no mercado livre, com a extinção das tarifas reguladas os preços de venda de eletricidade (e de gás natural) passam a ser definidos por cada comercializador a operar no mercado, extinguindo-se, assim, as tarifas fixadas pela ERSE. Esta entidade continuará, todavia, a fixar as tarifas de acesso às redes.
Assim, com a extinção das tarifas reguladas e com a consolidação progressiva do processo de liberalização, é provável que os comercializadores de mercado apresentem propostas comerciais inovadoras e invistam em ofertas combinadas de gás e eletricidade, como forma de incentivar a mudança para o mercado livre e desenvolver um mercado integrado.
VE - E como se processará esta transição?
CB - O calendário definido para a extinção de tarifas reguladas para os consumidores finais em baixa tensão apresenta dois momentos distintos: 1 de Julho 2012 para a potência contratada entre 10,35 kVA e 41,4kVA inclusive (corresponde aos maiores agregados familiares e pequenas empresas) e 1 de Janeiro de 2013 para a potência contratada até 10,35 kVA. Para além destas datas, são previstos períodos transitórios em que o fornecimento pelo CUR continua a ser possível, mas com um preço superior.
Tarifa transitória será fixada trimestralmente pela ERSE
VE - Quais as implicações para os clientes que não optem, de imediato, por aderir ao mercado livre? Vão ficar sem fornecimento de energia?
CB - Para os consumidores que até às datas referidas continuem a ser abastecidos pelo CUR, existirá uma tarifa transitória, fixada trimestralmente pela ERSE a um preço agravado, que, dependendo da potência contratada em causa, poderá vigorar por período transitório até 31 de Dezembro de 2014 (entre 10,35 kVA e 41,4 kVA inclusive) ou 31 de Dezembro de 2015 (até 10,35 kVA).
A legislação só determina a vinculação no fornecimento pelo CUR até ao termo dos referidos períodos transitórios. Estes períodos podem ser encurtados se mais de 90% dos consumidores do segmento tiverem mudado para o mercado livre, mas se a adesão dos consumidores se manifestar escassa, não se afasta uma eventual decisão de prorrogação dos prazos. O objetivo da extinção das tarifas reguladas é forçar a transição para o mercado liberalizado e o impacto da tarifa transitória poderá converter os consumidores resistentes à mudança.
VE - Todavia, os clientes que quiserem ficar no mercado regulado podem fazê-lo ou terão forçosamente de aderir ao mercado livre?
CB - Após a extinção destas tarifas, os CUR não poderão celebrar novos contratos com os consumidores. Todos os novos contratos de venda de eletricidade e gás natural serão obrigatoriamente estabelecidos em regime de mercado (preço) livre, excluindo-se apenas os clientes economicamente vulneráveis que poderão optar por ser fornecidos pelo CUR. Os consumidores devem assim procurar um comercializador em regime de mercado livre até ao fim dos referidos períodos transitórios.
VE - No caso de um consumidor mudar para o mercado livre e não ficar satisfeito pode voltar ao mercado regulado?
CB - Os consumidores podem mudar de fornecedor as vezes que entenderem, e como tal podem regressar ao mercado regulado até à data da extinção das tarifas reguladas, cessando tal possibilidade com o início dos períodos transitórios.
VE - E o que acontecerá aos consumidores economicamente vulneráveis?
CB - Os clientes economicamente vulneráveis mantêm o direito a ser fornecidos pelo CUR com uma tarifa fixada pela ERSE (Tarifa Social), e a beneficiar dos descontos previstos no apoio social extraordinário ao consumidor de energia (ASECE). Este benefício aplica-se quer o fornecimento ocorra através do CUR ou em regime de mercado livre e desde que o beneficiário efetue prova da sua elegibilidade junto do respetivo comercializador.
Gás natural e eletricidade mais caros a partir de julho
O gás natural vai subir 6,9%, a partir de julho, o que representa mais 1,58 euros numa fatura mensal de 24 euros, anunciou a Entidade Reguladora do Setor Energético (ERSE) na passada semana. Este aumento dirige-se aos clientes com consumo anual inferior ou igual a 500 m3, isto é, para as famílias e as pequenas empresas.
No âmbito da liberalização do mercado de energia, a mesma entidade decidiu também aumentar em 2% as tarifas de eletricidade para consumidores com potências contratadas iguais ou superiores a 10,35 kVA para os quais a tarifa regulada acaba a 01 de julho.
Os consumidores com potências contratadas superiores ou iguais a 10,35 kVA, fundamentalmente empresas, mas também famílias com consumos mais elevados, deixam a 01 de julho as tarifas reguladas, passando a ser aplicadas tarifas transitórias. Os preços dizem respeito ao período entre 1 de Julho e 31 de Dezembro deste ano. |
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FERNANDA SILVA TEIXEIRA fernandateixeira@vidaeconomica.pt |
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