24-07-2012 António Pontes, presidente da comissão executiva do Finibanco em Angola, afirma "Agora serão mais os angolanos a investir em Portugal"
"Os ciclos da economia vão criando situações diferentes: houve períodos em que eram os portugueses a investir em Angola, agora serão mais os angolanos a investir em Portugal. Isso parece--me natural, dada a história e os laços que unem os dois países", afirma à "Vida Económica" o presidente da comissão executiva do Finibanco em Angola. A aposta em Angola é "um vetor fundamental para a presença no exterior do Montepio, que certamente se irá alargar a outros mercados", acrescenta António Pontes.
Vida Económica - Qual é a linha orientadora do Finibanco Angola?
António Pontes - A linha orientadora terá de seguir quatro vetores fundamentais.
Um deles é tentar consolidar a imagem de marca, que continua a ser Finibanco, apesar da aquisição do Montepio. Essa consolidação tenta fazer-se com um bom atendimento e serviço ao cliente, que, de momento, nem sempre é fácil de conseguir, dado o grau de qualificação e aprendizagem do pessoal. Daí a nossa aposta forte na formação e desenvolvimento das capacidades técnicas e profissionais do pessoal. Temos de dar o salto para um banco de média dimensão e isso implica abrir novos pontos de venda. Neste momento, o plano estratégico prevê triplicar o número de balcões do banco nos próximos dois anos. Estamos, também, a preparar uma nova imagem, mais jovem e moderna, e que permita aproximar mais o banco do seu acionista principal, que é o Montepio. Outro vetor importante é a sustentabilidade, o que, para ser alcançada, implica um reforço importante dos capitais. O banco tinha capitais muito pequenos, que não foram problema numa primeira fase mas agora exige-se claramente um reforço desses capitais, porque só dessa forma conseguiremos sobreviver neste mercado obedecendo a todas as regulamentações que entretanto foram implementadas. Aqui, a entrada do Montepio no capital do Banco veio dar uma ajuda fundamental a esse reforço de capitais.
Outro vetor é a rentabilidade, que foi muito boa nos anos passados, vertente que, apesar da maior complexidade atual do mercado angolano, iremos tentar defender, já que é aquilo que os acionistas nos pedem. Em concreto, os acionistas querem retorno e, apesar das dificuldades que hoje existem, iremos tentar conseguir os níveis de rentabilidade do passado. As regras do mercado mudaram imenso. Nos últimos 12 meses, há uma mudança tremenda, quer ao nível da regulamentação quer das exigências de capitais próprios, quer da intervenção do BNA na política monetária, que tem influenciado fortemente a descida das taxas de juro. Isto faz com que margens "gordas", que eram possíveis no passado, se tornem cada vez mais difíceis de obter. Apesar das dificuldades, o vetor da rentabilidade terá de ser sempre uma das linhas fundamentais da nossa atuação.
VE - O contributo para o setor bancário em Angola tem sido positivo?
AP - Fomos pioneiros na criação de uma academia de formação de pessoal, já que os quadros locais têm muito espaço para crescer e portanto fizemos essa aposta. O próprio BNA reconheceu o mérito por termos dado esse passo. É um esforço que se faz, trazendo temporariamente quadros de Portugal para ensinar os fundamentos do negócio bancário aos nossos funcionários que, em muitas situações, foram contratados com muito pouca formação. Ao nível económico, realizou-se recentemente a assinatura de um acordo com o Ministério da Economia e das Finanças que se chama Angola Invest, onde há fundos públicos de apoio a iniciativas de empreendedorismo angolano, de empresas pequenas ou até microempresas. Existem duas linhas de apoio, uma de crédito bonificado e outra com garantia parcial a 70% do crédito e o Finibanco também assinou esse protocolo, contribuindo assim para o desenvolvimento económico do país, quer ao nível da formação dos quadros, quer do apoio à economia é também um dos vetores que nos tem motivado.
VE - Quais as principais alterações que resultam da compra e integração no Montepio?
AP - Esta aposta em Angola é um vetor fundamental para a presença no exterior do Montepio, que certamente se irá alargar a outros mercados. Só pode ser positivo para o nosso desenvolvimento. Em 2011, logo após o sucesso da OPA do Montepio ao Finibanco, foi definida uma estratégia de crescimento do banco em Angola e reforçada em 2012. Para se ter um crescimento orgânico é preciso que seja sustentável e suportado em acionistas fortes com músculo financeiro significativo.
As próprias autoridades de supervisão viram essa aquisição com bons olhos, porque têm vindo a introduzir um conjunto de regras que, no essencial já estavam implementadas na Europa através do Basileia II, e sem a entrada do Montepio, seria difícil ao Finibanco cumpri-las, bem como ter uma estratégia de crescimento para uma presença forte em Angola. Num país como Angola, onde sabemos que ainda há muitas lacunas a preencher, é importantíssimo ter um suporte forte como aquele que o Montepio dá ao Finibanco.
VE - Que apoio é prestado aos investidores e exportadores portugueses em Angola?
AP - O Finibanco/Montepio tem apoiado, na medida do possível, este negócio, que é muito suportado em pequenas e médias empresas, com predominância de empresários com origem/base no Norte de Portugal. Na minha perspetiva, só faz sentido a um banco fazer uma aposta numa operação no exterior se for para acompanhar os seus clientes que já tem em Portugal. Só faz sentido montar operações no estrangeiro se for nessa perspetiva. O Finibanco tem em Angola uma carteira muito interessante de clientes com quem já fazia negócio em Portugal.
VE - Quais são os aspetos que as PME têm que ter em conta ao abordar o mercado angolano?
AP - Qualquer investidor no estrangeiro, seja em Angola ou noutro qualquer país, deve, em primeiro lugar, analisar séria e profundamente o mercado onde se vai envolver. Se pensa que é só chegar e as coisas caem do céu, a experiência vai resultar sempre em fracasso. Para formar uma empresa em Angola, é necessário ter um bom parceiro local. E aqui é fundamental escolher o parceiro certo, senão, em vez de acrescentar valor ao negócio, vai destruir esse valor. O segundo passo é saber se esse parceiro ajuda a alavancar a ideia de negócio que se tem. A economia angolana tem alguns aspetos que devem ser acautelados. Portugal, ainda, é o primeiro ou segundo parceiro de Angola nas importações para este país, mas há, de momento, projetos angolanos que vão no sentido de reduzir as importações, como é o caso do protocolo Angola Invest, recentemente assinado. Portanto, aquilo que podia ser uma boa ideia de negócio há um ano pode já não o ser num futuro próximo, porque, entretanto, já existe localmente capacidade para desenvolver essa atividade. É preciso estudar bem todos os aspetos, designadamente no domínio da alimentação. Por outro lado, a mobilidade no país não é fácil mesmo dentro da grande metrópole urbana de Luanda. Portanto, depende das perspetivas de negócio de cada um e se tem de ter mobilidade ou não. Até porque as condições de logística também não são fáceis. Normalmente, deveriam ter um bom plano de negócios com esses aspetos e outros muito bem definidos antes de arriscar no que quer que seja.
VE - Qual é o potencial interesse dos investidores angolanos no mercado português?
AP - É inquestionável que os angolanos gostam de Portugal e, portanto, se têm capitais disponíveis porque não investir em sítios que conhecem, de que gostam, que falam a mesma língua? E se os portugueses têm capitais disponíveis, porque não investir em Angola? Os ciclos da economia vão criando situações diferentes: houve períodos em que eram os portugueses a investir em Angola, agora serão mais os angolanos a investir em Portugal. Isso parece-me natural, dada a história e os laços que unem os dois países.
Economia angolana depende em 80% do petróleo
Apesar de todos os esforços que têm vindo a ser desenvolvidos para a diversificação das atividades económicas, estima-se que pelo menos 80% da economia angolana ainda depende do petróleo.
Perante tal dependência, a variação dos preços do petróleo tem necessariamente de se refletir em toda a economia. Tanto mais que o petróleo é um produto que está cotado em todos os mercados mundiais e, como é sabido, os reflexos da globalização fazem-se sentir em todos os domínios.
"Têm-se descoberto novas jazidas de petróleo, designadamente as chamadas "pré-sal", mas à custa de investimentos complexos e caros, o que faz com que o custo da produção seja muito mais elevado do que era na exploração tradicional de petróleo", esclarece.
O preço do petróleo tem estado muito volátil. Nos anos 2008/2009 desceu abaixo do ponto de equilíbrio, para alguns exportadores de petróleo. "Flutuações bruscas terão necessariamente impacto nas economias, mas se os orçamentos definidos não tiverem as folgas suficientes é inevitável que vão surgir atrasos de pagamento", acrescenta.
"Angola, tal como outras economias petróleo-dependentes, vai estar sempre sujeita a esses ciclos, pelo que terá de adequar todo o seu planeamento financeiro e orçamental a essa inevitabilidade. Desde que haja rigor nesses cálculos, certamente que terá menos problemas do que já teve no passado".
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João Luís de Sousa jlsousa@vidaeconomica.pt |
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